Resenhas

FILME – NÃO VAMOS PAGAR NADA (2020)

Em 2020, no início da pandemia de Covid-19, o cinema brasileiro nos presenteou com “Não vamos pagar nada”, dirigido por João Fonseca, e com Samantha Schmutz no elenco (aqui o trailer oficial). Trata-se da tradução fílmica da peça “Non si paga! Non si paga!” (FO, 1974), que chegou pela primeira vez nos teatros brasileiros em 1980, com o título “Pegue e não pague”, direção de Gianfrancesco Guarnieri, e que ganhou diferentes montagens nos 40 anos que nos separam da primeira representação.

No prólogo da comédia em dois atos, Fo explica que quando a sua companhia estreou a peça, em 1974, a história parecia surreal, já que narrava eventos nunca acontecidos até então: mulheres da periferia de Milão que, ao se depararem, no supermercado, com preços inflacionados com os quais não poderia arcar, decidiram no começo pagar apenas a metade do valor das compras e, depois, não pagar nada. Mas, alguns meses depois, conta Fo, esses fatos aconteceram exatamente como contados na peça (FO; RAME. Teatro. Torino: Einaudi, 2000, p. 615). Aqui vocês podem ver um trecho de um vídeo da peça com Franca Rame e Dario Fo.

A adaptação de João Fonseca para a atualidade brasileira, que na hora da estreia coincidiu com a crise sanitária e econômica desencadeadas pela pandemia SARS-Cov-2, “mostra que pouco mudou na sociedade e que, apesar dos mais de 40 anos que separam uma obra da outra, infelizmente as críticas se mantêm bem atuais….” – Leia mais aqui.

Que pena que só é possível assistir em streaming (devido à pandemia), e sem a certeza de que a camada social dos protagonistas da história de Antônia, João, Luis e Margarida tenham a possibilidade de apreciar…

PEÇA – FRANCESCO (dezembro de 2019)

A peça Francesco, com tradução e direção de Neyde Veneziano, e atuação de Paulo Goulart Filho, com certeza teria continuado a sua turnê se a pandemia não tivesse parado tudo, ou quase, poucos meses depois de sua estreia. “São contos populares de São Francisco, não é a história da vida dele. São cinco episódios que contam passagens dele, mas num contexto mais popular do que religioso”, explica o ator na bela entrevista concedida a um jornal local, e na qual se encontram as principais informações sobre o espetáculo dedicado ao santo mais popular da Itália, e talvez de todo o mundo católico. Esses monólogos, como Goulart Filho lembra no mesmo artigo, são “uma versão mais popularesca de São Francisco, que eu, inclusive, não conhecia, pois não tinha essa visão dele, que era, na verdade, um grande ator, um grande contador de histórias. Ele levava mensagens do evangelho para o povo de uma forma muito lúdica.”

Aqui há uma entrevista com Neyde Veneziano e Paulo Goulart Filho, falando sobre Francesco.

Lu santo jullàre Françesco (FO; RAME. Einaudi: 1999), é fruto de uma pesquisa sobre os contos populares que narram a vida de Francesco realizada por Fo, Rame e sua equipe na região de Francesco, a Úmbria. Nas informações complementares em seu livro, Dario Fo define esses testemunhos como verdadeiras obras-primas da tradição oral que, em um primeiro momento, pareciam frutos da fantasia, mas que depois, consultando as crônicas e os anais redigidos pelos históricos da região e da época de Francesco – inclusive dos mais reconhecidos hoje, como Coiro e Muratori – tiveram a confirmação de que as aparentes fábulas tinham, na verdade, fundamentos reais e documentados (FO; RAME, 1999, p. 123-124).

Esse compromisso com a pesquisa e as fontes está desde sempre atrelado ao trabalho de Franca Rame e Dario Fo: todas as vezes que se debruçam na escrita e encenação sobre determinados personagens e/ou eventos históricos, buscam outras maneiras de contar a(s) história(s), outras fontes silenciadas pelos livros “oficiais”, combinando o papel lúdico e divertido do teatro, do povo e para o povo. Essa busca caracteriza o seu trabalho, assim como o compromisso com o povo, de quem são incansáveis intermediários, para quem são incansáveis criadores, com sua vasta e rica produção.

Voltando ao nosso Santo Jogral Francisco, no parágrafo conclusivo do compêndio, os autores reforçam a denúncia de censura das obras escritas durante a vida do Santo e nos 40 anos que se seguiram depois da sua morte. Essa censura durou por cinco séculos, sendo que, somente a partir do século XVII até alguns anos antes da realização da peça, reapareceram “milagrosamente” os escritos de Tommaso de Celano e muitas crônicas de religiosos escondidas em mosteiros e bibliotecas, muitas vezes distantes da Itália. E foi assim que nasceu a possibilidade de trazer um outro Francesco ao público.

Neste vídeo de Raiplay, é possível assistir a estreia do espetáculo de Dario Fo, completo, no Auditório de Nápoles, Itália.

FILME – AMORE IN QUATTRO DIMENSIONI (1964)

“Amor em quatro dimensões” foi um filme de grande sucesso que estreou mundialmente em 1964. Trata-se de uma produção franco-italiana, dirigida por uma equipe, em sua maioria, de italianos. Eles desenvolveram uma trama cinematográfica subdividida em quatro episódios intitulados “Amore e alfabeto”, “Amore e arte”, “Amore e vita” e por fim “Amor e morte”. A comédia aborda o amor em diferentes perspectivas, tem duração de 105 minutos e fazem parte do elenco Franca Rame, Carlo Giuffré, Carlo Bagno, Franca Polesello entre outros. 

Como por outros filmes em que Franca Rame fez parte do elenco, também esse foi exibido e reexibido diversas vezes, tornando-se portanto o filme franco-italiano com maior visibilidade no Brasil no período de 1964 a 1989. Nossa pesquisa – realizada na Hemeroteca da biblioteca Nacional / RJ – levantou mais de 54 ocorrências nos periódicos brasileiros, diversas manchetes e mais de cinco horários para a exibição em um mesmo cinema, obtendo destaque em toda mídia nacional  . A crítica cinematográfica da época diz que este filme pode ser visto de um prisma moderno, sendo muito curioso, divertido e irônico, o  que aproximou  e instigou  o interesse do público, tanto aqui no Brasil quanto em diversos outros países em que este esteve em evidência. Franca Rame atuou em dezenas de filmes em sua carreira. Em  “Amore e alfabeto” interpretou Suzy, a estrela, como mencionado em matéria publicada em “O Jornal – RJ”. Com centenas de feedbacks positivos, tanto da crítica, quanto de influenciadores e de espectadores em geral, este filme se faz presente até os dias de hoje. Para os cinéfilos interessados na obra, é possível encontrá-la com facilidade em plataformas de streaming, porém sem dublagem ou legendagem em português.

FILME – CAPORALE DI GIORNATA (1958)

Traduzido e adaptado ao português brasileiro, O filho do batalhão foi uma comédia de sucesso em muitos países, inclusive no Brasil. Como parte do elenco, temos artistas como Franca Rame, Nino Manfredi, Riccardo Garrone, Gisella Sofio, Walter Santesso entre outros. Dirigido por Carlo Ludovico Bragaglia e com sua estreia no ano de 1958, tem duração de 88 minutos, e foi muito bem recebido pelo público brasileiro, assim como verifica-se em resultados obtidos através de  pesquisa realizada a facsimiles do período de 1960/1989, disponíveis na Hemeroteca da Biblioteca Nacional – RJ. 

O filme tem enredo baseado no evento em que um recém-nascido com uma bilhete identificando-o como “filho de Felice” é abandonado na guarita de um quartel. Os quatro soldados chamados Felice são convocados e interrogados. Cada um deles tem boas razões para acreditar que é o pai, e nesse sentido, a obra desencadeia boas risadas, sem deixar de lado o suspense e a apreensão para se saber quem de fato é o pai da bebê, porém entre trocas de pessoas e mal-entendidos, a mãe da criança resolverá o caso e revelará a identidade do homem. 

Os cinemas brasileiros deram espaço a este filme durante um longo período, pois ele foi exibido e reexibido diversas vezes,  e foram encontradas cerca de 17 ocorrências que possibilitam observar os impactos que este causou tanto na cultura, quanto no público brasileiro. A obra foi premiada em um dos eventos mais famosos do mundo, Festival de CANNES, e teve exibição em locais de grande prestígio em nosso país, como no Art Palácio e Império – RJ. Como uma boa produção nunca perde a validade, este filme pode ser encontrado em plataformas de streaming a disposição dos  cinéfilos que amam comédia, atualmente não se encontra o filme completo traduzido para o português, em sua maioria, estão disponibilizados para o público em sua formatação original, no idioma italiano.